O domingo amanheceu com chuva e
logo depois do almoço resolvemos voltar para a cidade. Fora o susto que eu
passei com meu primo Ricardo, o final de semana havia sido perfeito. Decidi
naquela noite ficar em minha casa, pois tinha que levantar cedo para ir ao
estágio na segunda-feira. Na verdade, eu temia que Nando começasse a me achar
um grude. Afinal, eu estava dormindo direto no apartamento dele e, antes que eu
fosse mandada embora, resolvi eu mesma ir sozinha.
Quando abri a porta, deparei-me
com minha irmã e Guto assistindo televisão. Assim que Rafa me viu, exclamou
irônica:
- Oh! Temos visita!
Larguei minha mochila em cima da
mesa da sala e disse sem saber ainda se ela estava brincando ou querendo me
provocar:
- Só vim saber se minha cama
continua no mesmo lugar.
- Ué... O bonitão enxotou você da
cama dele?
- Não. Só vim dormir aqui hoje
porque não quero que ele me confunda com um chiclete. E sentir uma saudadezinha
de vez em quando sempre é bom.
Sentei-me na poltrona, esticando
as pernas, já sentindo falta do Nando. Meu cunhado perguntou curioso:
- E então? Como foi o fim de
semana?
- Perfeito – suspirei, lembrando
como quase tudo fôra por água abaixo – Choveu quase o tempo todo e por isto foi
tão bom.
- Nossa... Quem te viu e quem te
vê – debochou Rafaela – Nada como um homem para modificar uma mulher. Logo você
que mal saía de casa...
- Escute Paulinha – começou a
falar Guto, empolgado – Nós vamos para a praia no carnaval. Quer ir com a
gente?
- Obrigada, Guto, mas eu já
combinei com o Nando de ir para Floripa. Vamos ficar na casa de um amigo dele.
Com o semblante mais fechado,
Rafaela me aconselhou:
- Paulinha, não se sinta
inferiorizada por você ser a única pobretona no meio de um monte de gente rica
metida à besta.
Isto também já me havia ocorrido,
porém não quis dar o braço a torcer. Respondi, tentando demonstrar que aquilo
jamais me atingiria, quando eu sabia que era exatamente o contrário:
- Pouco me importa se eles têm
dinheiro ou não.
- Pode ser que para você tanto
faça, mas não para a turma dele.
Lembrei do jeito que eu havia
sido observada pelos amigos do Nando na praia. Eu não queria admitir, mas minha
irmã tinha toda a razão.
- O que importa é o que Nando
pensa de mim.
- Pode acreditar que ele pensa
muito bem sobre você – retrucou Rafaela, deixando-me feliz com aquele
comentário – senão ele não a convidaria para passarem juntos o carnaval. O que
me incomoda é a discriminação que você pode sofrer.
Realmente Rafaela demonstrava
estar preocupada. Guto então disse:
- Bem, você não é nenhuma criança
para imaginar que sempre será tudo maravilhoso, não é mesmo, Paulinha?
Às vezes eu me perguntava o que
eu estava fazendo. Era como se fosse tudo uma brincadeira de mau gosto. Não era
um papel que eu estivesse acostumada a desempenhar. Simplesmente eu estava
enganando todo mundo. Nando, minha irmã e em um futuro muito próximo, meus pais
e meus tios, caso meu relacionamento com ele desse certo.
- Ei, Paulinha! – chamou-me Guto,
despertando-me dos meus terríveis pensamentos sombrios – Escutou o que eu disse
para você?
Encarei Guto, agoniada. Com a voz
rouca, respondi ao mesmo tempo em que me levantava e pegava a mochila:
- Claro que sim. Você tem razão.
Boa noite – e desapareci dentro do meu quarto, trancando-me lá dentro.
Naquela noite custei a dormir.
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