Foi uma droga desde que coloquei
os pés na areia. A impressão que tive é que fomos seguidos, o que não era
verdade, claro. Os amigos do Nando e suas respectivas namoradas apareceram
vindos não sei de onde, com um jet ski à reboque. Vi que os olhos do meu amor
brilharam quando se depararam com o jet ski e previ que certamente eu teria que
dividir minha atenção com aquele trambolho. Os rapazes, todos muito gentis,
armaram uma tenda para que nós todas nos protegêssemos do sol. Eu não tinha a
menor intenção de ficar próxima a elas, mas não havia alternativa para mim.
Minha pele sempre foi muito clara, ao contrário das outras que estavam super bronzeadas
e concorrendo entre si para quem adquiriria um câncer de pele primeiro.
Aproximei-me do Nando que estava
à beira mar, preparando o jet ski. Eles sairiam para dar uma volta, mas meu
namorado me prometeu:
- No máximo em meia hora eu
retorno. Você acha que consegue ficar sozinha com elas?
A pergunta foi feita em tom de
sussurro. Na verdade eu não tinha a menor vontade de ficar com as vacas. Só de
ver o Nando prestes a sair já foi motivo para meu estômago doer, mas eu não
podia obrigá-lo a ficar comigo o tempo todo. Respondi, demonstrando muita
calma:
- Claro que sim. Vá tranqüilo.
Ele me beijou e eu fiquei ali
pertinho, assistindo aos meninos saírem. Depois que eles partiram, eu me dirigi
lentamente à tenda. Surpresa. As três vacas haviam tomado o espaço, não
sobrando uma mísera sombrinha para mim. E o sol estava cada vez mais forte. Fiz
de conta que não me importava. Peguei minha sacola de praia, tirei minha toalha
de dentro e passei um protetor solar fator 50, sempre sabendo que todos meus
movimentos eram atentamente acompanhados por elas. Uma senhora que estava
próxima a mim se ofereceu para passar o protetor nas minhas costas, o que me
tranqüilizou bastante, pois eu já estava temendo outra insolação. Então,
achando-me protegida do sol, deitei na toalha, fechei os olhos e passei a
escutar a conversa enjoada das amiguinhas da Raquel.
Elas sabiam que eu estava
escutando tudo, apesar de nem me mexer. A conversa girava sobre ela, a Raquel.
Para me provocar em seguida começaram a falar no Nando também, do tempo em que
ele estava noivo da outra. Deram a entender que o relacionamento era perfeito e
que a separação não seria para sempre. Comecei a me incomodar quando escutei isso,
porém permaneci totalmente impassível, de olhos fechados. A seguir veio um
relato de quando Raquel caiu de jet ski e Nando a salvou, heroicamente,
arrancando aplausos de quem assistiu a cena. Morri de raiva.
A meia hora do Nando levou muito
mais tempo. Além de eu estar com fome, indignada e com calor, não suportava
mais o matraquear das gralhas. O nome de Raquel eu já havia escutado mais de
cem vezes e só não voltei a pé para casa porque não sabia o caminho. De repente
ouvi vozes conhecidas e entre elas identifiquei a do Nando. Nem acreditei. Dei
um salto da toalha e fui até ele aliviada. Esperava que agora ele me desse um
pouco de atenção e me tirasse de perto delas.
- E então? – ele me perguntou com
o rosto queimado do sol – Demorei muito, não é?
- Não. Nem me dei conta – menti
descaradamente.
Neste momento Nando olhou para a
tenda e reparou que Karine, Tati e Sandrinha tinham ocupado todo o espaço
debaixo dela.
- Espere aí! Você não ficou
debaixo da tenda que armamos para vocês?
- Não.
Foi a única coisa que consegui
responder, pois um bolo se formou na minha garganta. Não, eu não iria chorar
ali na frente de todo mundo. Jamais daria esse prazer a elas.
- Puxa, você está quente – ele
disse encostando a mão na minha pele – Vamos nos refrescar um pouco no mar.
Apesar das ondas fortes, nem
senti tanto medo assim. Preferia enfrentar o mar a ficar ao lado das monstras.
E nunca me diverti tanto. O mar era tão azul que eu enxergava meus pés. Elas
ficaram na areia e deixaram a proteção da tenda quando viram que eu não
voltaria mais para lá. Depois de algum tempo, quando estávamos mais perto do
raso, o Nando resolveu perguntar:
- Elas incomodaram muito você?
Felizmente minha vontade de
chorar já tinha passado. Consegui responder sem tremer a voz:
- Falaram o tempo todo na Raquel.
A expressão dele se crispou.
Continuei:
- Chegaram mesmo a relatar aquela
vez que ela caiu do jet ski e você a salvou.
- Como?
- Você a salvou de se afogar e
até as pessoas que estavam na areia o aplaudiram. Lembra?
- Não posso lembrar-me de algo
que nunca aconteceu – retrucou Nando, alterado – Essas mulheres estão loucas!
Eu nunca salvei Raquel de afogamento nenhum. Ela detestava praia, mar, areia.
Nos últimos tempos eu sempre vinha sozinho para o litoral.
Cheguei a ficar arrepiada. Elas
estavam realmente a fim de perturbar meu relacionamento com o Nando. E não
estávamos nem na metade do feriadão ainda. O que mais podia ainda acontecer?
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