Saltei da cama angustiada. Eu
sabia que o motivo para aquela saída antecipada só podia ser eu.
− Eu fiz alguma coisa?
Ele me encarou rapidamente.
− Não.
As respostas curtas me deixavam
nervosa. Ele estava quase no fim.
− Posso ajudar você?
− Não se preocupe com nada. Suas
coisas já estão prontas. Se você quiser tomar banho, vá logo.
Corri para o banheiro e tomei uma
ducha de três minutos. Quando saí encontrei tudo pronto. Joguei a toalha na
cama e o olhei tensa.
− Quer comer alguma coisa ainda?
Certamente a resposta que o Nando
gostaria de escutar era um “não”.
− Não.
− Certo. Comemos qualquer coisa
no caminho.
Reparei que ele vestia a mesma
roupa da noite passada quando pegou as minhas mochilas e as poucas coisas que
havia trazido.
− Você dormiu, Fernando?
− Ainda não. Por quê?
− Vai aguentar dirigir?
− Claro que sim – Nando respondeu
sorrindo pela primeira vez – Ei! Não faça esta cara de susto.
− Não estou assustada – mas minhas
palavras tremeram no final desmentindo-me.
− Escute, você não tem nada a ver
com isto tudo, entendeu? Eu conto para você depois.
Resolvi ficar quieta. Descemos as
escadas e encontramos Sérgio lá embaixo. Acho que nós éramos as únicas pessoas
acordadas àquela hora, quase nove horas da manhã.
−Oi, Pauline – cumprimentou ele
sem o seu costumeiro sorriso.
− Oi – respondi sem jeito.
Meio sem graça, Sérgio abriu a
porta da caminhonete para que eu entrasse. Nando e ele se despediram
acaloradamente e em seguida meu namorado entrou no carro, ligando o motor.
Confesso que fiquei aliviada quando deixamos a casa e as monstras para trás,
chegando mesmo a suspirar. Esperei que o Nando falasse alguma coisa, mas ele
permanecia mudo. Somente quando chegamos na estrada é que ele disse,
finalmente:
− Desculpe, Pauline.
Fiquei sem saber o que dizer.
Talvez fosse eu quem tivesse que pedir desculpas. Tinha a nítida sensação de
tudo o que estava acontecendo era por minha culpa. Por fim, criei coragem e o
encarei antes de perguntar:
− Desculpas pelo quê?
− Por tudo.
− Por tudo o quê?
Foi a vez de ele ficar em
silêncio.
− Por eu ter trazido você para
cá. Acho que fui insensível... As meninas são amigas da Raquel. Eu jamais iria
imaginar que elas lhe tratariam daquele jeito.
− Mas eu não estou zangada com
você – retruquei – Você não tem culpa se elas se comportaram como crianças. Não
precisava ter abandonado a casa daquele jeito. Eu…
− A Raquel está vindo para cá –
esclareceu Nando deixando-me surpresa – Aquelas loucas ligaram ontem para ela
dizendo que eu estava na praia, de namorada nova.
− Como você soube? – Não preciso
dizer que eu estava cada vez mais chocada com o comportamento daquelas vacas
loucas.
− Pelo Sérgio. Ele escutou a
conversa – meu namorado fez uma pausa e continuou – Raquel está transtornada
desde que rompemos. Não sei do que ela seria capaz de fazer se nos visse
juntos.
Respirei fundo. Simplesmente as
amigas do Nando tinham acabado com a nossa praia. A vantagem é que estávamos
bem longe delas. Parecendo que lera meus pensamentos, Nando disse firmemente:
− Não vou deixar que tudo isso
arrase o nosso feriadão.
− É mesmo? – perguntei curiosa –
O que você sugere, então?
− Você já conhece a serra
catarinense?
− Claro que não. Por quê? É para
lá que você pretende me levar?
− Levar? Não. Eu vou sequestrar
você.
Eu ri de pura satisfação.
Inclinei-me para beijá-lo e então Nando me repreendeu, brincando:
− Você vai fazer com que eu perca
o controle do carro. E do resto também.
Agora sim as coisas estavam
entrando nos eixos. Finalmente ficaria sozinha com ele, em algum lugar com certeza
bem aconchegante. Meu feriadão estava recém começando.
− Você alguma vez já passou o
carnaval na serra? – perguntei.
Nando me encarou com um sorriso
nos lábios, malicioso.
− Nunca. Sempre fui para a praia surfar.
− E será que você vai suportar
ficar longe das ondas?
− Claro que sim. É você quem está
comigo.
Fiquei toda arrepiada. Nossa! Os
próximos dias prometiam ser de muita felicidade, desde que eu conseguisse
despistar minha verdadeira identidade.
− Assim você me deixa convencida.
A modéstia vai começar a passar longe daqui.
− Só tem uma coisa...
− O que é?
− Eu estou lhe sequestrando. E
isto significa que você está sob o meu poder.
− Tenho direito a resgate?
− Evidente que não. E não me
interrompa. Você vai ficar o resto da semana aqui comigo.
− Nando! Você está falando sério?
Eu tenho que trabalhar na quarta-feira de cinzas!
− Problema do seu chefe.
− Nando – eu não sabia se me
preocupava com o fato de faltar ao estágio ou se ficava feliz – eu não avisei
que…
− Pauline, você odeia o seu
curso. Você odeia o que faz. Não se boicote, seja feliz.
Seja feliz. Adorei escutar Nando
dizer isso. Eu nunca havia sido tão feliz desde que o conhecera.
− Sou feliz. Agora eu sou feliz –
eu disse explodindo de tanto amor.
Beijei-o novamente já esquecida
daqueles dois dias passados na praia. Nada mais me importava. Esqueci minha
família, meu estágio, o resto. Meu mundo era o Nando e eu não precisava de mais
nada.
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